Por Filipe Denki
Muitas empresas brasileiras, durante a pandemia da Covid-19, tiveram de recorrer a uma medida extrema para evitar a falência, que é pedir recuperação judicial. A medida nada mais é do que um respiro que a legislação brasileira permite a uma companhia para tentar se reerguer, renegociando suas dívidas e, às vezes, até desenhando um novo plano de negócio.
O número de pedidos de recuperação judicial aumentou 50% em agosto deste ano ao chegar aos 111 contra os 74 do mês anterior, em setembro foram 56 pedidos. De acordo com o Indicador de Falências e Recuperação Judicial da Serasa Experian, o mês de agosto foi o que registrou o maior número de pedidos desde o começo de 2021. A maior parte das requisições partiram do segmento do comércio (43,2%).
Do total de 696 pedidos de recuperação judicial até o mês de setembro, 476 pedidos foram de micro e pequenas empresas, 146 de médias empresas e 74 de grandes empresas.
Em que pese, as grandes empresas terem em regra caixa e uma estrutura mais organizada para aguentar crises prolongadas, em 2021 diante da grave crise econômica que o país vive, atingindo todos os setores da economia, muitas estão recorrendo a recuperação judicial para renegociar suas dívidas.
É o caso da LATAM com dívidas superiores a R$ 7 bilhões, que pediu recuperação judicial nos Estados Unidos, da Supervia, companhia de trens urbanos do Rio de Janeiro com dívidas em torno de R$ 1,2 bilhões. O Grupo Metodista de Educação possui dívidas que ultrapassam a casa dos R$ 500 milhões.
Também temos o caso de famosas redes varejistas que pediram recuperação judicial como é o caso da TNG, que tem mais de 180 lojas e dívida estimada de R$ 65 milhões, a Le Postiche, com 140 lojas e dívida de R$ 140 milhões, e a Cavalera, com 11 lojas e dívida de R$ 11 milhões.
Porém, nenhuma delas chamou mais a atenção do que o caso da mineradora Samarco, joint-venture da Vale e da BHP Billiton. Com o processo em curso, a empresa tenta renegociar a sua dívida total, que já ultrapassa R$ 50 bilhões em passivos, manter as operações que foram retomadas no fim de 2020 e suspender temporariamente as ações dos mais de 2 mil credores que enfrenta dentro e fora do Brasil.
A recuperação judicial da Samarco tornou-se a 3ª maior da história do país através da empresa Oi S/A com dívida superior a R$ 65,4 bilhões, 2ª colocada, e o da Odebrecht a maior do país com passivo superior a R$ 84 bilhões.
A recuperação judicial é uma medida jurídica legal onde a empresa em dificuldade financeira consegue um prazo para continuar operando enquanto negocia com seus credores, sob mediação da Justiça. As dívidas ficam congeladas por 180 dias, podendo ser prorrogada por igual período. Durante a recuperação judicial a empresa (devedor) apresentará um plano de recuperação judicial visando renegociar suas dívidas, esse plano poderá prever novas condições de pagamento como desconto, carência e parcelamento, entre diversas outras medidas.
No início do ano, havia uma expectativa do aumento de pedidos de recuperação judicial. Empresas especializadas no assunto apontavam o número de pedidos de recuperação judicial que pode chegar a 1,8 mil em 2021, uma alta de 53% em relação ao ano passado.
O número de casos, se confirmado, será semelhante aos observados na crise de 2015 e 2016, ano com o maior número de pedidos da história, quando uma das mais agudas crises econômicas levou grande número de empresas a pedir proteção judicial para negociar com seus credores.
O que não se sabe ao certo é o motivo pelo qual ainda não houve um aumento nos pedidos de recuperação judicial esperado, já que a grave crise econômica que estamos vivendo resultou no fechamento de mais de 1 milhão de empresas ano passado, retração do PIB em 4,1% em 2020 como uma leve expectativa de melhora esse ano e um número recorde de desempregados que ultrapassam os 15 milhões de pessoas.
O que temos certeza é que, tanto as grandes e médias empresas estão suscetíveis de passar por dificuldades financeiras, sendo necessário a utilização de ferramentas de reestruturação empresarial como é o caso da recuperação judicial, e os números nos mostram isso.
Filipe Denki – Sócio do Lara Martins Advogados. Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC/GO. Especialista em Direito e Processo Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC/GO. Especialista em Direito Empresarial e Advocacia Empresarial pela Universidade Anhanguera. Formação Executiva em Turnaround Management pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Ex-Presidente da Comissão de Recuperação de Empresas e Falência da OAB/GO (triênio 2019/2021). Diretor da Comissão de Recuperação de Empresas e Falência do Conselho Federal da OAB (triênio 2022/2024). Diretor do Instituto Brasileiro de Direito da Empresa – IBDE. Membro dos institutos de insolvência empresarial TMA, IBAJUD, INSOL e IBR. Professor de Direito da Insolvência na Escola Superior da Advocacia – OAB/GO e na Escola Superior da Magistratura do Estado de Goiás. Coordenador do Curso de Formação de Administradores Judiciais da ESMEG. Árbitro da Câmara de Mediação e Arbitragem da Associação Comercial e Industrial do Estado de Goiás – CAM/ACIEG e do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem – CBMA. Árbitro e Coordenador do Núcleo de Reestruturação e Insolvência Empresarial da Câmara de Mediação e Arbitragem Especializada – CAMES. Membro do Comitê de M&A e Reestruturação de Empresas da Câmara de Mediação e Arbitragem Empresarial Brasil – CAMARB. Palestrante em diversos eventos e autor de artigos e livros sobre a área de insolvência.