Por Filipe Denki.
Como sabemos, no dia 24 de dezembro de 2020 foi promulgada a Lei nº 14.112/20 que reforma a lei de falência e recuperação de empresas (Lei nº 11.101/05).
Essa lei era esperada ansiosamente por diversos agentes econômicos e profissionais das mais diversas áreas, é não é para menos, já que estamos passando por uma grave crise econômica causada pela pandemia do coronavírus. Os governos e parlamentos do mundo todo se movimentam para tentar conter os efeitos da crise e evitar, no caso das empresas, uma quebradeira generalizada.
Dentre as alterações e inclusões trazidas pela Lei nº 14.112/20, um dos pontos altos da nova lei é a previsão expressa do chamado dip financing.
A nova lei dedicou uma seção exclusiva ao tema, a seção IV-A, intitulada, “Do Financiamento do Devedor e do Grupo Devedor durante a Recuperação Judicial” que compreende os artigos 69-A a 69-F.
Mas o que seria o Dip Financing?
É a sigla de debtor-in-possesion financing, cuja a tradução seria “financiamento do devedor em posse”, ou seja, financiamento do devedor em recuperação judicial.
O financiamento do devedor e do grupo devedor durante a recuperação judicial, como a própria lei o chama, é uma modalidade de novo financiamento para uma empresa que está em processo de recuperação judicial, ou seja, que já possui um plano aprovado ou em discussão por seus credores para o pagamento de suas dívidas.
Uma das maiores dificuldades da empresa em recuperação judicial é a obtenção de recursos para manutenção e fomento de sua atividade. O DIP Financing tem principal finalidade suprir a falta de caixa presente na empresa para financiar despesas operacionais como pagamento de fornecedores, salários, despesas administrativas, entre outros.
Embora o DIP Financing já fosse utilizado em processos de recuperação judicial em tramitação sob a égide da Lei nº 11.101/05, algumas situações não permitiam sua ampla utilização pelas empresas com dificuldade financeira.
Dentre elas destaco a demora na aprovação dos novos termos do financiamento, ausência de bens da devedora livre desembaraçados para serem dados em garantia, e uma melhor classificação do referido crédito em caso de convolação em falência.
Com a promulgação da “nova lei de falências e recuperação de empresas”, essa modalidade de crédito terá maior segurança jurídica, redução do prazo de aprovação e prioridade do novo financiamento, de modo a disseminar a prática no mercado.
Para isso, a legislador conferiu ao dip financing natureza extraconcursal, ou seja, não sujeição do crédito os efeitos da recuperação judicial e prioridade no recebimento em caso de convolação em falência, inclusive tendo prioridade dentre os créditos classificados como extraconcursais e a impossibilidade de modificação de sua natureza/classificação em hipótese alguma.
Durante a recuperação judicial, o juiz poderá, depois de ouvido o Comitê de Credores, autorizar a celebração de contratos de financiamento com o devedor, garantidos pela oneração ou pela alienação fiduciária de bens e direitos, seus ou de terceiros, pertencentes ao ativo não circulante, para financiar as suas atividades e as despesas de reestruturação ou de preservação do valor de ativos.
O juiz poderá autorizar a constituição de garantia subordinada sobre um ou mais ativos do devedor em favor do financiador de devedor em recuperação judicial, dispensando a anuência do detentor da garantia original, ou seja, o compartilhamento das garantias pelos atuais credores.
Caso a recuperação judicial seja convolada em falência antes da liberação integral dos valores (Dip Financing), o contrato de financiamento será considerado automaticamente rescindido.
Nesse sentido, o DIP Financing garante que o devedor em recuperação judicial continue gerando caixa para manter sua operação, bem como propicia o pagamento de todos os demais credores, assegurando assim as condições necessárias para o cumprimento do plano de recuperação.
Na minha opinião todas essas melhorias trazidas pela Lei nº 14.112/20 tendem a conferir mais sucesso aos processos de recuperação judicial, que segundo estudos possuem índices baixíssimos.
Filipe Denki – Sócio do Lara Martins Advogados. Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC/GO. Especialista em Direito e Processo Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC/GO. Especialista em Direito Empresarial e Advocacia Empresarial pela Universidade Anhanguera. Formação Executiva em Turnaround Management pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Ex-Presidente da Comissão de Recuperação de Empresas e Falência da OAB/GO (triênio 2019/2021). Diretor da Comissão de Recuperação de Empresas e Falência do Conselho Federal da OAB (triênio 2022/2024). Diretor do Instituto Brasileiro de Direito da Empresa – IBDE. Membro dos institutos de insolvência empresarial TMA, IBAJUD, INSOL e IBR. Professor de Direito da Insolvência na Escola Superior da Advocacia – OAB/GO e na Escola Superior da Magistratura do Estado de Goiás. Coordenador do Curso de Formação de Administradores Judiciais da ESMEG. Árbitro da Câmara de Mediação e Arbitragem da Associação Comercial e Industrial do Estado de Goiás – CAM/ACIEG e do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem – CBMA. Árbitro e Coordenador do Núcleo de Reestruturação e Insolvência Empresarial da Câmara de Mediação e Arbitragem Especializada – CAMES. Membro do Comitê de M&A e Reestruturação de Empresas da Câmara de Mediação e Arbitragem Empresarial Brasil – CAMARB. Palestrante em diversos eventos e autor de artigos e livros sobre a área de insolvência.