Especialistas na área ambiental celebram as medidas realizadas pelo governo federal visando o controle e combate aos incêndios florestais, mas destacam a necessidade de um pacto entre todos os entes federados para que o problema seja, de fato, solucionado. Uma área equivalente a pelo menos 58% do território nacional já foi afetada pela seca neste ano. Diante do cenário, o governo empregou ao menos 1.400 brigadistas para combater as chamas, além de ter destinado R$ 600 milhões para ações emergenciais contra a seca. Paralelamente, a Polícia Federal conduz ao menos 30 inquéritos para apurar os incêndios registrados nos biomas Amazônia e Pantanal.
“A premissa é de que são esforços elogiáveis. Há, realmente, um entendimento da gravidade da situação e, dentro do que é possível ser feito, o governo está fazendo o que é possível ser feito. Mas é preciso que se dê ao cenário a gravidade que se tem. Nós estamos em um cenário de emergência climática, e não começa agora, não vem de agora. Desde 2021, por exemplo, o Observatório do Clima vem avisando em relação ao tema”, afirma o cientista político e advogado e membro do Observatório do Clima, Nauê Bernardo Azevedo.
“Não adianta mirar só no governo federal. É preciso que exista um restabelecimento do pacto federativo e todos os entes federados atuem dentro das suas esferas de competência para ter um combate adequado, um manejo adequado, uma prevenção adequada e uma repreensão adequada aos crimes ambientais. É preciso chamar para essa conversa o Congresso Nacional, porque precisamos de leis com punições realmente inibidoras dessas práticas. Também precisamos que o Poder Judiciário aplique as sanções de forma exemplar”, acrescentou.
A advogada especialista em direito ambiental, professora da Universidade Federal de Goiás e sócia do Lara Martins Advogados, Luciana Lara, destaca que o artigo 225 da Constituição Federal prevê que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e que cabe ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
“O poder público, em todas as suas esferas de atuação, tem o dever, a obrigação, conforme elencado no artigo 225 da Constituição Federal, de preservar e resguardar a proteção ambiental em nosso país. Essa proteção se estende para a adoção de todas as medidas que forem necessárias para manter o equilíbrio ecológico e a manutenção dos ecossistemas existentes no país. Todos os investimentos recentemente propostos com o intuito de se combater e evitar ainda mais o alastramento dos fogos, provocados pelos incêndios, sejam eles de forma natural ou criminosa, devem, sim, ser adotados por parte do poder público”, disse Luciana.
“Nós temos, portanto, essa obrigação, enquanto sociedade, de fiscalizar toda a atuação, de estarmos atentos à destinação dos investimentos públicos no setor para que se evite um prejuízo e dano irreparável maiores, tanto para o meio ambiente quanto para a saúde humana. Os investimentos são oportunos, mas não podemos deixar de desconsiderar que a prevenção também elenca os princípios norteadores da proteção ambiental brasileira”, completou a advogada.
Ações do Executivo
Na última terça-feira (10), o STF (Supremo Tribunal Federal) realizou uma audiência para debater as ações tomadas pelo governo para combater os incêndios florestais e ampliar a proteção do clima.
Na audiência, a procuradora-chefe da Procuradoria Nacional de Defesa do Clima e do Meio Ambiente da AGU (Advocacia-Geral da União), Mariana Barbosa, explicou que os incêndios no país e em outras nações são intensificados pela mudança do clima, que causa estiagens prolongadas em biomas como Amazônia e Pantanal. Segundo dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, 58% do território está afetado pela seca neste ano, e em cerca de um terço o cenário é de seca severa.
Mariana argumentou que há um esforço do governo para integração das plataformas que disponibilizam dados federais e estaduais relacionados à vegetação. A procuradora citou o Cadastro Ambiental Rural, gerido pelo governo com dados validados e atualizados pelos estados. “É um trabalho de compartilhamento, de aprimoramento do federalismo cooperativo. Por isso a importância da participação ativa de todos os órgãos”, disse na audiência.
Diante do cenário, o governo criou na última quarta-feira (11) o comitê nacional de manejo integrado do fogo. Entre as atribuições do grupo estão a produção de relatórios anuais sobre os incêndios e a proposta de mecanismo de controle das chamas, além da sistematização das informações nacionais.
O decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva prevê também a criação do centro integrado de multiagência de coordenação operacional federal, que será responsável por monitorar a situação dos incêndios no país, e a instalação de uma sala de situação única. A partir daí, os dados serão compartilhados em operações em andamento pelo país.
Nesta semana, o presidente anunciou a criação de uma autoridade climática, prometida durante a campanha eleitoral de 2022. Lula disse também que vai enviar uma medida provisória ao Congresso Nacional para estabelecer o estatuto jurídico da emergência climática.
Após visita em regiões atingidas pela seca, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva destinou R$ 650 milhões para a Amazônia. Do total, R$ 500 milhões serão utilizados em quatro anos em intervenções de dragagem nos rios do estado para facilitar a navegação em meio à estiagem.
Em audiência no Senado, recentemente, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, explicou que, para o combate ao fogo, foram empregados R$ 60 milhões em 2022. O valor subiu para R$ 89,3 milhões em 2023 e para R$ 111,3 milhões em 2024.
Segundo o Sistema Integrado de Informações sobre Desastres, foram cadastrados ao menos 1.418 pedidos de reconhecimento de situação de emergência ou calamidade pública neste ano. O governo federal atua com 1.468 brigadistas do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) na Amazônia Legal.
Advogada. Sócia do Lara Martins Advogados. Doutoranda em Ciências Jurídicas pela Universidade Autônoma de Lisboa (UAL). Mestra em Direito, Relações Internacionais e Desenvolvimento pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (2015). Especialização em andamento em Direito Ambiental (2021). Especialista em Direito Público pela Universidade Cândido Mendes (2014). Especialista em Direito Processual Civil pela Uniderp – Anhanguera LFG (2014) e especialista em Formação em Ensino à Distância pela Universidade Paulista (2018). Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (2012). Intercâmbio Acadêmico realizado na Universidad de Sevilla (2010).