Por Filipe Denki Belém Pacheco.
Uma dúvida recorrente tanto dos operadores do direito como dos credores em geral na área de direito falimentar é sobre como se processa a execução¹ de um crédito que não está sujeito à Recuperação Judicial.
¹ Nesse caso, execução é gênero do qual se incluem os processos em fase de cumprimento de sentença.
Estabelece a Lei de Falência e de Recuperação de Judicial das Empresas nº. 11.101/05, em seu art. 49, ressalvadas as exceções nela previstas, que estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não estejam vencidos. Os créditos supervenientes ao pedido não se sujeitarão à Recuperação Judicial, portanto.
Os tribunais pátrios, o Superior Tribunal de Justiça especialmente, tem se posicionado no sentido de que o cumprimento de sentença (execução) de créditos não sujeitos à recuperação judicial deverá ser processado – ou ter prosseguimento – no juízo de origem, local da distribuição, e não se submeterá ao juízo da recuperação judicial. (Resp nº 1.298.670 – MS, CC 105.345/DF e AgRg no AREsp 468.895/MG). O próprio STJ, no entanto, já se manifestou no sentido de que os atos expropriatórios são de competência do juízo universal recuperacional. (Resp nº 1.630.702-RJ, CC 88.661/SP e CC 137.178/MG).
A interpretação conjunta das normas contidas nos artigos 6º, 47 e 49 da Lei de Falência e Recuperação Judicial, bem como o entendimento do STJ acerca da questão, permitem concluir que o juízo onde tramita o processo de recuperação judicial, por ter à sua disposição todos os elementos que traduzem com precisão as dificuldades enfrentadas pelas devedoras, além de todos os aspectos concernentes à elaboração e à execução do plano de recuperação, é que deve decidir sobre o destino dos bens e valores objeto de execuções singulares movidas contra a Recuperanda (empresa em recuperação).
A referida lei garante, ainda, o direito ao stay period que nada mais é do que a suspensão do curso de todas as ações e execuções movidas em face da empresa devedora pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, com exceção para aquelas ações que demandarem quantia ilíquida, ou seja, importância ainda incerta, e as execuções fiscais.
Há, então, um conflito pois, ao mesmo tempo em que o cumprimento de sentença e/ou a execução deverá ocorrer no juízo de origem, os atos expropriatórios são de competência do juízo da recuperação judicial.
Na prática, isso tem sido resolvido das seguintes formas: 1. O Juízo determina a suspensão do processo em fase cumprimento de sentença e determina que a parte interessada habilite seus créditos nos autos da recuperação judicial; 2. Quando não há o pagamento voluntário, o juízo determina o prosseguimento do feito e, por consequência, o início dos atos expropriatórios, como a penhora via BacenJud; 3. O Juízo simplesmente determina o arquivamento do processo por entender que não é competente e o credor fica sujeito ao juízo da recuperação judicial que, provavelmente, não aceitará a habilitação de crédito tardia pelo fato do crédito não estar sujeito à recuperação judicial.
Tem se firmado o entendimento no sentido de que os créditos não sujeitos à recuperação judicial não devem ser habilitados na RJ, mas que deve ser expedida ordem para que o juízo da recuperação judicial determine o pagamento do crédito no momento adequado.
Há a possibilidade, ainda, de que seja determinada a expedição de carta precatória que será distribuída por dependência aos autos do processo de recuperação judicial a fim de que o Juízo universal determine o pagamento do débito que está sendo executado, pois, seria esse o juízo competente para verificar o momento ideal para a liquidação das dívidas de modo que não impacte o plano principal de recuperar a empresa.
Por fim, há possibilidade, ainda, de criação de uma lista de credores que não estão sujeitos à Recuperação Judicial, que ficaria sob a responsabilidade do juízo da recuperação judicial, que também verificaria o tempo e a forma de pagamento conforme a capacidade econômica da devedora e a efetiva execução do plano de recuperação judicial sem que houvesse prejuízo. Assim, bastaria ao credor solicitar a expedição de certidão de crédito no juízo do origem e apresenta-la ao juízo recuperacional para que seu crédito fosse incluído da referida lista, o que suspenderia o cumprimento de sentença (execução) até que o pagamento do débito de fato ocorresse.
Essas são algumas das atuais possibilidades quando se fala em execução de crédito que não se enquadra nos parâmetros estabelecidos pela Lei nº. 11.101/2005 – Lei de Recuperação Judicial e Falência e, por se tratar de temática bastante controvertida, é importante ressaltar a relevância do acompanhamento por um profissional especialista no assunto.
Filipe Denki – Sócio do Lara Martins Advogados. Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC/GO. Especialista em Direito e Processo Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC/GO. Especialista em Direito Empresarial e Advocacia Empresarial pela Universidade Anhanguera. Formação Executiva em Turnaround Management pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Ex-Presidente da Comissão de Recuperação de Empresas e Falência da OAB/GO (triênio 2019/2021). Diretor da Comissão de Recuperação de Empresas e Falência do Conselho Federal da OAB (triênio 2022/2024). Diretor do Instituto Brasileiro de Direito da Empresa – IBDE. Membro dos institutos de insolvência empresarial TMA, IBAJUD, INSOL e IBR. Professor de Direito da Insolvência na Escola Superior da Advocacia – OAB/GO e na Escola Superior da Magistratura do Estado de Goiás. Coordenador do Curso de Formação de Administradores Judiciais da ESMEG. Árbitro da Câmara de Mediação e Arbitragem da Associação Comercial e Industrial do Estado de Goiás – CAM/ACIEG e do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem – CBMA. Árbitro e Coordenador do Núcleo de Reestruturação e Insolvência Empresarial da Câmara de Mediação e Arbitragem Especializada – CAMES. Membro do Comitê de M&A e Reestruturação de Empresas da Câmara de Mediação e Arbitragem Empresarial Brasil – CAMARB. Palestrante em diversos eventos e autor de artigos e livros sobre a área de insolvência.