Por Filipe Denki Belém Pacheco
Com base nas lições do caso Janie and Jack, pergunta-se: Recuperação judicial é uma fake news do mundo empresarial ou uma possibilidade real de superação de uma crise?
Em junho de 2017, a Gymboree Group, com sede na Califórnia, Estados Unidos, líder global no segmento de moda infantil, que conta em seu portfólio com marcas como a Janie and Jack, ícone em moda infantil e sinônimo de luxo, classe e sofisticação, anunciou seu pedido de proteção contra a falência (Chapter 11), procedimento semelhante ao nosso pedido de recuperação judicial e, como parte do processo, a companhia fechou 375 de suas 1.300 lojas.
Em 17 de janeiro de 2019, a Gymboree Group anunciou novo pedido de proteção contra a falência, todavia, dessa vez a empresa informou que planejava vender suas lojas da Janie and Jack.
Recentemente a Gap Inc., informou ao mercado que adquiriu a Janie and Jack por US$ 35 milhões. A aquisição inclui a propriedade intelectual da empresa, seu website, dados de clientes e o aluguel de mais de 100 lojas.
Mas o que chama a atenção no caso Janie and Jack é que, durante todo esse período de pedido de proteção contra a falência, a companhia publicou três cartas públicas com o objetivo de esclarecer seus clientes sobre todas as medidas que estavam sendo tomadas para a superação da crise e, principalmente, para a preservação da empresa e para o cumprimento dos compromissos assumidos.
Nas redes sociais da empresa há mais de 1.200 perguntas de clientes preocupados com a situação da empresa. A maioria delas questionam acerca do pedido de recuperação judicial e das operações da Janie and Jack, sendo que todas elas foram prontamente respondidas.
No Brasil, para muitos, a recuperação judicial, ao contrário de constituir um instrumento legítimo para que as empresas em desequilíbrio possam se reorganizar, é vista como um calote legalizado ou institucionalizado.
Não são raros os casos em que as empresas se endividam propositalmente, visando obter na justiça a recuperação judicial, com o principal objetivo de legalizar o inadimplemento. Além dos casos em que os pedidos de recuperação judicial são feitos com informações incorretas ou distorcidas, documentos ilegítimos, que buscam lesar seus credores, fornecedores e até mesmo o Estado.
A lição que o caso Janie and Jack nos deixa é que toda empresa está sujeita a passar por dificuldades financeiras e, em muitos casos, a recuperação judicial pode ser a única alternativa para a superação de uma crise, mas, em todos esses casos, a empresa deve agir com boa-fé, com transparência e eficiência com o fim de preservar os interesses de seus clientes e fornecedores, assim como fez a companhia norte americana.
Dessa forma a recuperação judicial deixará de ser conhecida no país como um “calote legalizado”, uma fake News do mundo empresarial, e será apenas um instrumento eficaz para auxiliar as empresas viáveis a superarem suas crises econômico-financeiras, a atingirem seus objetivos por meio da manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, cumprindo, assim, sua função social.
Filipe Denki – Sócio do Lara Martins Advogados. Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC/GO. Especialista em Direito e Processo Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC/GO. Especialista em Direito Empresarial e Advocacia Empresarial pela Universidade Anhanguera. Formação Executiva em Turnaround Management pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Ex-Presidente da Comissão de Recuperação de Empresas e Falência da OAB/GO (triênio 2019/2021). Diretor da Comissão de Recuperação de Empresas e Falência do Conselho Federal da OAB (triênio 2022/2024). Diretor do Instituto Brasileiro de Direito da Empresa – IBDE. Membro dos institutos de insolvência empresarial TMA, IBAJUD, INSOL e IBR. Professor de Direito da Insolvência na Escola Superior da Advocacia – OAB/GO e na Escola Superior da Magistratura do Estado de Goiás. Coordenador do Curso de Formação de Administradores Judiciais da ESMEG. Árbitro da Câmara de Mediação e Arbitragem da Associação Comercial e Industrial do Estado de Goiás – CAM/ACIEG e do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem – CBMA. Árbitro e Coordenador do Núcleo de Reestruturação e Insolvência Empresarial da Câmara de Mediação e Arbitragem Especializada – CAMES. Membro do Comitê de M&A e Reestruturação de Empresas da Câmara de Mediação e Arbitragem Empresarial Brasil – CAMARB. Palestrante em diversos eventos e autor de artigos e livros sobre a área de insolvência.