Um dos desafios jurídicos do agronegócio brasileiro é a deficiência de regulamentação e a dificuldade de adequação das normas ao dia-a-dia no campo. Uma atividade que conta com fatores de produção variáveis, estruturas e frentes de trabalho móveis e isoladas, enfrenta sérios problemas no que diz respeito ao cumprimento das normas trabalhistas, na gestão do trabalho rural. Um exemplo latente são as constantes irregularidades verificadas por auditores em relação à Norma Regulamentadora 31, do Ministério do Trabalho e Emprego – MTE.
As Normas Regulamentadoras (NRs) são editadas pelo MTE e definem parâmetros de segurança e medicina do trabalho. Pode-se dizer que o assunto ainda é recente no país, pois, embora a Lei 5.889/1973, que trata sobre o trabalho rural, desde aquela época contenha a previsão da necessidade de observância das normas de segurança e higiene, somente 15 anos depois é que o trabalhador rural foi igualado ao urbano, em 1988, com a Constituição Federal, quando foram editadas as Normas Regulamentadoras Rurais (NRRs). Posteriormente, as NRRs foram substituídas pela Norma Regulamentadora 31, aprovada pela Portaria nº 86, de 03 de março de 2005.
Existem 36 Normas Regulamentadoras na legislação brasileira, aplicáveis para as mais diversas atividades econômicas, sendo que alguns setores devem cumprir mais que uma dessas NRs, como é o caso da agroindústria.
A NR 31, especificamente, dispõe sobre segurança e saúde no trabalho na agricultura, pecuária, silvicultura, exploração florestal e aquicultura. Seu principal objetivo é estabelecer regras de segurança na organização do ambiente de trabalho que sejam compatíveis com o planejamento e desenvolvimento dessas atividades rurais. Dentre algumas de suas disposições estão: a identificação de riscos existentes no local de trabalho, correto uso de agrotóxicos, meio ambiente e resíduos, ergonomia, ferramentas, segurança no uso de máquinas e implementos agrícolas, secadores, silos, transporte de trabalhadores e cargas, trabalho com animais e áreas de vivência, além de outras.
Essas regras são aplicáveis às relações de emprego desenvolvidas no meio rural, mesmo que sejam informais e em pequena quantidade (empregadores com 1 funcionário, por exemplo). A mesma regra também se aplica às atividades de exploração industrial desenvolvidas em estabelecimentos agrários, tais como as usinas de álcool e açúcar e propriedades de criação de gado, suínos e aves.
Mesmo que o intuito e a motivação da NR 31 sejam plausíveis e necessários, o que acontece é que muitos produtores, ou até mesmo grandes empresas rurais, não possuem estruturação, seja física, de pessoas, de conhecimento e gestão, suficiente para bem cumprir a norma. Tampouco, os empregadores são incentivados a o fazerem, através de políticas públicas. Considerados esses fatores, é possível compreender sua insatisfação quando são autuados pelos agentes do Ministério do Trabalho e Emprego.
A não observância das diretrizes da NR 31, no entanto, podem ser ainda mais graves do que a autuação e a imposição de multas: acidentes envolvendo máquinas agrícolas e atividades correlatadas e desgastantes, muitas vezes, levam os trabalhadores rurais à doença ou à acidentes fatais. Com o óbito de um funcionário ou sua debilidade física, o dano vai além dos prejuízos materiais com multas, porquanto atinge a vida e a saúde das pessoas.
Por isso, o cumprimento da NR 31 deve ser incluído no planejamento da atividade agrícola. Com o levantamento de todas as regras aplicáveis ao negócio rural, o empregador pode estabelecer quais medidas adotará para evitar autuações, acidentes e doenças, ou minimizar seus efeitos negativos e, por meio de ações pontuais e uma organização jurídica trabalhista é possível superar a insegurança e profissionalizar o campo.
Advogada e mediadora de conflitos. Pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, especialista em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas e pós-graduada em Direito do Agronegócio, Meio Ambiente e Desenvolvimento na Universidade de Rio Verde. Membro da Comissão Especial de Direito do Agronegócio e da Comissão de Conciliação, Mediação e Arbitragem da OAB de Rio Verde.