Como quase tudo relacionado ao direito do trabalho, até uma data comemorativa se torna polêmica. No dia de hoje, primeiro de maio, comemora-se o Dia do Trabalho ou Dia do Trabalhador? Historicamente celebra-se do Dia do Trabalho, não somente no Brasil, mas em diversos lugares do mundo. No entanto, é também muito comum utilizar-se a menção do trabalhador, já que este é o verdadeiro destinatário da data comemorativa.
Mas, independentemente de ser o dia do “trabalho ou trabalhador”, fato é que é um dia reservado a comemorações e, muito mais do que isso, reflexões a respeito das relações de trabalho, partindo-se de uma luta histórica pela melhoria das condições de trabalho. No dia 01 de maio de 1886, na cidade de Chicago dos EUA, milhares de trabalhadores foram às ruas reivindicar, entre outras melhorias, redução da jornada de trabalho para 08 horas diárias.
Essa data passou a ser marcada como um grande marco para atos em favor da conquista de direitos dos trabalhadores. Foi nesse mesmo dia que no ano de 1940 foi instituído o salário mínimo e em 1941 criada a Justiça do Trabalho e, no ano seguinte, editado o Decreto-lei 5.542/43, que aprovou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que hoje faz 75 anos de idade! Não há data melhor para uma boa reflexão a respeito do momento que passa as relações de trabalho no Brasil.
No turbilhão político-ideológico de uma “reforma trabalhista”, temos de um lado quem acredita que o país está caminhando para a legalização da exploração do mão-de-obra de forma precária. Esse pensamento é explicado pela flexibilização dos vínculos trabalhistas (por meio de contratos de terceirização, trabalho autônomo, entre outros). Para eles, afastar as normas CLTistas de uma relação de trabalho seria o mesmo que remontar a Chicago, em 1886, quando não se tinha limitação diária de trabalho, sendo comum desempenharem suas funções por doze, quatorze horas por dia, sem maiores preocupações com normas de saúde e segurança do trabalho.
De outro lado, temos quem enxerga essa “modernização das relações de trabalho” como um avanço necessário para se respeitar novos tempos de pensamento livre e motivação empreendedora na sociedade. Defendem que a grande maioria prefere ver o resultado de seu trabalho ser remunerado de acordo com o mérito alcançado e não tão somente porque cumpriu sua carga horária diária, com o resultado do trabalho absolutamente desconectado do resultado. A livre economia e relação contratual entre as pessoas seria o objetivo maior das alterações legais que, segundo essa ala, ainda é tímida.
É claro que as análises são muito mais profundas e as consequências tanto para uma linha de argumentação quanto para outra vão muito além desse resumo de pensamento acima exposto. Mas ele é suficiente para demonstrar o quão dividido está o país em torno de um tema tão complexo. Os profissionais do direito passaram a ser classificados jocosamente como “a favor” ou “contra” a reforma. Amigos deixaram de ser conversar. Colegas de trabalho deixaram associações, criaram outras, tudo em razão da “irracionalização” do debate. O nível de estresse e vício ideológico na argumentação passou a ser tão evidente que ninguém quer saber o argumento do outro. A nova realidade de debate a respeito das relações de trabalho é a de que as pessoas já ouvem com intenção de criticar ou discordar, antes mesmo de tentar entender.
Onde não há consenso, é natural que haja o conflito. Mas onde não houve um diálogo saudável, o conflito pode se tornar agressivo, animalesco. Refletir sobre as relações de trabalho nesse primeiro de maio de 2018, em que se celebra 75 anos da CLT é muito mais do que debater direito do trabalho. É debater o país em que se quer viver. O conceito de justiça social e até mesmo de amor ao próximo.
Em poucos meses o país decidirá muito mais do que seus próximos quatro anos. O novo governo eleito será o responsável pela consolidação ou reversão de mudanças tão profundas no seio da relação jurídica mais importante de toda sociedade – a trabalhista. Enquanto isso, todos os cidadãos que, ilusoriamente acreditam estar muito distantes das reais definições do futuro, devem se levantar do berço esplêndido e tomar partido, entendendo e refletindo sobre suas escolhas.
Amadurecer o diálogo e os discursos é essencial. Falar em direito do trabalho é muito mais do que falar em “chão de fábrica” ou canavial, é falar também de uma nova geração de jovens urbanos que não pretendem se conectar a modelos engessados de relação jurídica, seja trabalhando de forma tradicional ou “na nuvem”. Falar em direito do trabalho é compreender que há uma massa gigantesca de trabalhadores que precisa de muito mais proteção do que atualmente tem, mas é também aceitar e compreender que há um sem-número de profissões e profissionais que buscam desesperadamente, novas formas de contratar e se vincular no ambiente laboral.
É tempo de refletir. É primeiro de maio!
Advogado. Sócio nominal. Doutorando em Direitos Humanos pela UFG. Mestre em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas (UDF). Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Goiás (UFG), especialista em Direito do Trabalho pela PUC-GO. Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (gestão 2022/2024).