A recente decisão do Superior Tribunal de Justiça representa um marco relevante no Direito das Sucessões e amplia a proteção a pessoas em situação de vulnerabilidade. O caso envolveu uma viúva de 78 anos que não possuía outra fonte de renda e que, por testamento, foi beneficiada com uma pensão vitalícia deixada pelo marido. A disputa surgiu porque as filhas do falecido se recusavam a cumprir a obrigação antes do término do inventário, alegando que apenas após a partilha seria possível iniciar o pagamento.
A advogada Aline Avelar, especialista em Direito das Famílias e Sucessões e responsável pelo núcleo da área no escritório Lara Martins Advogados, destacou a relevância da decisão. Segundo ela, “no caso uma viúva de 78 anos, que não tinha outra fonte de renda, e aqui a gente fala até de uma forma de planejamento sucessório e que o esposo falecido deixou para ela em testamento uma pensão vitalícia. Esses alimentos vitalícios são comparados à pensão alimentícia. Então, quando visto isso, o caráter urgente é a decisão. Ela constatou que, independente da conclusão do inventário, essa decisão devia ser cumprida, essa pensão deveria ser imediatamente exigível”.
A interpretação do STJ se deu pelo fato de o testamento não especificar a data de início da obrigação. Diante disso, aplicou-se o artigo do Código Civil que vincula o cumprimento da vontade testamentária à abertura da sucessão, ou seja, ao momento do falecimento. Para a advogada, essa escolha do tribunal “priorizou a saúde, essa questão de vulnerabilidade da viúva, levando em consideração a morosidade de um processo. Então teve preservado esse direito dela. É uma decisão que pode repercutir em decisões futuras também”.
Em relação à origem da pensão, Aline explicou que “esse valor será retirado dos bens deixados. Eu imagino que esses bens gerem algum tipo de renda líquida para o pagamento”. A medida reforça que a obrigação se vincula ao patrimônio herdado e deve ser rateada proporcionalmente entre os herdeiros, respeitando a determinação do testador.
A advogada também alertou sobre a importância de clareza ao elaborar testamentos: “especificar uma data, a partir de que momento essa vontade vai passar a ser cumprida. Então, sempre especificar todas as questões trazidas, as vontades trazidas, a partir de quando isso irá valer”. Essa prática previne disputas familiares e agiliza o cumprimento das cláusulas testamentárias.
Outro ponto relevante mencionado por Aline é a nomeação de um testamenteiro. “O testamenteiro inclusive pode ser o advogado que o auxilia no momento de elaboração desse testamento e ele fica ali responsável por fazer cumprir todas as vontades desse testador para depois da morte dele. Então, com a presença de um testamenteiro, fecha ainda mais as margens para discussão.”
Impactos sociais e precedentes
A decisão, além de assegurar dignidade à viúva envolvida, projeta efeitos para além do caso concreto. “Com certeza é uma decisão que foi um marco e abre essa possibilidade para quem tem essa condição de prestar uma pensão alimentícia. Outras decisões futuras que se baseiem nesse tipo de critério de data, com certeza vão ter essa decisão como precedente”, observou a advogada.
A abrangência pode alcançar outros grupos vulneráveis, como filhos inválidos ou dependentes com deficiência. Como explicou Aline, “desde que o testador tenha um beneficiado mesmo no testamento, pode sim”.
Para a especialista, trata-se de um avanço jurídico que reforça princípios constitucionais: “com certeza é um direito necessário, encaminhado aí. O Direito de Família e Sucessões é encaminhado para atender a cada dia mais os princípios da dignidade da pessoa humana. E isso com certeza é uma ferramenta que vem para atender esse tipo de casos”.
Embora a jurisprudência não se aplique de forma automática a todos os processos, abre caminho para fundamentar decisões em situações semelhantes. Nas palavras da advogada, “não é de forma automática. A jurisprudência vem para se encaixar em determinados casos. Cada um tem ali um critério que acaba diferenciando. Então, ela vai ser plausível para casos futuros”.
A decisão do STJ, portanto, não apenas garantiu a subsistência imediata de uma viúva em situação de vulnerabilidade, mas também estabeleceu um precedente importante que poderá orientar novas discussões judiciais em matéria de sucessões.
Aline Avelar é advogada, especialista em Direito das Famílias e Sucessões, Planejamento Familiar, Patrimonial e Sucessório. Presidente da Comissão de Jurisprudência do IBDFAM-GO. Secretária-geral da Comissão de Sucessões da OAB Goiás. Diretora Instituto de Estudos Avançados em Direito – IEAD. Membra do IBDFAM, professora, mentora e palestrante.


