Skip to main content

 

Por Lélio Aleixo

 

A incorporação da inteligência artificial (IA) no sistema judiciário brasileiro, especialmente no Supremo Tribunal Federal (STF) e nos tribunais superiores, tem promovido uma transformação significativa na análise e processamento de precedentes jurídicos. Ferramentas como o Projeto Victor e o Módulo de Apoio para Redação com Inteligência Artificial (MARIA), ambas do STF, exemplificam essa inovação.

 

O Projeto Victor, desenvolvido em parceria com a Universidade de Brasília (UnB), visa aprimorar a resolução de processos e reduzir o congestionamento nos tribunais, acelerando as decisões do STF de maneira mais eficiente. Essa ferramenta utiliza algoritmos de IA para analisar e classificar recursos extraordinários, identificando temas de repercussão geral e agrupando processos com questões similares. Isso não apenas agiliza a tramitação processual, mas também contribui para a uniformização da jurisprudência, garantindo maior previsibilidade e segurança jurídica.

 

Já o MARIA, lançado em dezembro de 2024, utiliza IA generativa para auxiliar na produção de diversos tipos de textos, como resumos de votos, relatórios em processos recursais e análises iniciais de reclamações. Essa ferramenta contribui para a celeridade e eficiência dos serviços do Tribunal, permitindo que os ministros e seus assessores se concentrem em aspectos mais complexos e decisivos dos processos.

 

No contexto do Código de Processo Civil (CPC) de 2015, que instituiu um sistema de precedentes qualificados, a abundância de dados e a capacidade de processamento proporcionadas pela IA impõem novos desafios e responsabilidades à advocacia. O CPC/2015 promoveu a instauração do stare decisis no direito brasileiro, acelerando uma paulatina caminhada desenvolvida desde a década de 90 do século passado.

 

Nesse cenário, o papel do advogado se torna ainda mais crucial na tarefa de adequação ou distinção de precedentes. A técnica de distinção, ou distinguishing, permite ao jurista argumentar que o precedente invocado não se aplica ao caso em questão devido a diferenças fáticas ou jurídicas relevantes. Essa habilidade requer uma análise minuciosa e criteriosa, garantindo que a aplicação dos precedentes seja feita de forma justa e adequada às especificidades de cada caso.

 

A utilização de IA no judiciário não substitui a atuação humana, mas a complementa, fornecendo ferramentas que auxiliam na gestão e análise de grandes volumes de informações. Para os advogados, isso significa a necessidade de desenvolver competências que lhes permitam interagir eficazmente com essas tecnologias, interpretando os dados fornecidos e aplicando-os de maneira estratégica em suas argumentações.

 

Além disso, a IA pode ser uma aliada na pesquisa de jurisprudência, identificação de padrões decisórios e até mesmo na previsão de possíveis desfechos processuais. No entanto, é fundamental que o profissional do direito mantenha uma postura crítica e ética, assegurando que as decisões sejam pautadas não apenas em dados, mas também em princípios jurídicos e valores fundamentais.

Em suma, a convergência entre advocacia, processo civil e inteligência artificial representa uma evolução natural do sistema jurídico brasileiro. Enquanto a IA oferece ferramentas poderosas para a gestão e análise de informações, cabe à advocacia o papel insubstituível de interpretar, argumentar e garantir que a justiça seja aplicada de forma equânime e humana. A sinergia entre tecnologia e prática jurídica, aliada a uma compreensão profunda dos precedentes, fortalece o compromisso com a justiça e a eficiência no cenário jurídico contemporâneo.